Entrevista com René Laurentin (1998)
Raymundo Lopes encontrou-se novamente com o padre René Laurentin em meados de 1998. O encontro deu origem a novo artigo na revista Chrétiens Magazine, a de nº113, de 15 de setembro do mesmo ano.
Chrétiens Magazine nº 113, de 15 de setembro de 1998.
Visita de Raymundo Lopes,
de Belo Horizonte
Raymundo Lopes, o vidente presumido de Belo Horizonte, que abandonou sua lucrativa empresa de importação para se consagrar unicamente à Virgem, malgrado a responsabilidade sobre a família e uma filha deficiente, veio novamente visitar-me. Uma pessoa curada por sua oração fez questão de oferecer-lhe uma viagem a Fátima. De lá ele foi a Roma, e depois veio ver-me, sempre com a mesma preocupação que o levou procurar-me no último ano, na ocasião de minha viagem à Bolívia (La Paz e Cochabamba): chamar a atenção de seu bispo, que faz ouvidos moucos aos seus pedidos por uma entrevista.
Eu me preocupava com essa tensão com o bispo de Belo Horizonte, hoje cardeal, e apontei este aspecto negativo na Chrétiens Magazine de 15 de outubro de 1997, nº 104, p. 23-24; após o primeiro artigo, de 15 de janeiro de 1997, nº 97, onde apresentei a aventura: como esse brilhante empresário de uma importadora, favorecido por uma vida bela e fácil, foi apanhado no dia 28 de janeiro de 1992, às 2 horas da manhã, por um triplo chamado (como Samuel, em 1 Samuel 2). Uma interlocutora misteriosa lhe propôs nove encontros, durante nove terças-feiras consecutivas, de início com locuções, até que na sexta terça-feira ele a viu pela primeira vez, na Igreja de São Sebastião. “Eu sou a Senhora do Rosário”, ela lhe disse.
– Eu suspeitava que era Ela, e desde então fiquei convicto – ele me confidenciou.
O restante está contado na Chrétiens Magazine de 15 de janeiro de 1997.
Encontrei um Raymundo mais maduro, mais profundo. Já no primeiro encontro eu simpatizei com sua sociabilidade e sua leveza brasileira, sua transparência e seu humor, sua maneira objetiva e concreta de apresentar cada coisa como ele a vivia, sem afetação nem desejo de impressionar de modo algum: o testemunho puro de um homem sincero. O que percebi nele desta vez foi uma nova dimensão adquirida na paciência e numa total confiança em Deus e Nossa Senhora, através das dificuldades que ainda o deixavam angustiado no ano anterior, na Bolívia. Ele as assume agora na paz e até mesmo na alegria de Deus. Eu ia começar a fazer-lhe um monte de perguntas, mas ele logo tomou a iniciativa, porque tinha algo a me dizer.
Raymundo: Minha única preocupação é fazer a vontade de Deus. Vejo tudo por uma luz discreta. A Virgem ainda me fala, mas não a vejo mais.
René Laurentin: Você sabe que a Virgem perguntou à Vicka se ela aceitava que ela interrompesse as aparições desde 17 de janeiro… até hoje, 6 de junho?
– Para mim, isso acontecerá durante 1260 dias: de 12 de fevereiro de 1997…
O dia seguinte à grande aparição pública, na Praça do Papa?
– Até 25 de julho de 2000.
E como você vive este intervalo?
Procuro força para corresponder à vontade de Deus e encontrar o meu bispo.
Você ainda não se encontrou com ele? Por quê?
– Ele pensa que eu ganho dinheiro com as aparições.
Ele não sabe que você abandonou o seu emprego, o seu ganha-pão? Como você sobrevive?
– Minha mulher possui algumas casas, que nós alugamos, e uma agência de seguros. Da minha parte, não tenho nada. Mas a Virgem me disse: “Você não tem necessidade de dinheiro, Deus lhe bastará”.
Ele disse isso com um sorriso confiante, disponível, sem a menor afetação, ele não procura entender como essa situação vai terminar.
E da parte do arcebispo, hoje cardeal?
– Escrevi uma carta para ele. Eu lhe disse: estou contente que o senhor seja cardeal, sou seu amigo. Pedi que o senhor seja sempre maior diante de Deus, e amaria que o senhor pudesse me receber, pois tenho necessidade dos seus conselhos. A Virgem me disse que o senhor era uma pessoa importante para a Igreja.
O que ele respondeu?
– Não recebi resposta, mas a secretária dele me telefonou dizendo que um contato poderia ser estabelecido após o seu retorno da Conferência Latino-Americana.
Raymundo relatou em seguida a sua viagem a Fátima.
– O amigo cuja esposa foi curada me propôs a viagem, e eu estava reticente. Mas eis que um dia eu estava puxando o cinto de segurança do meu carro quando uma criança estendeu a mão através da janela e me disse: “Não deixe de ir a Fátima”. Era uma criança de cerca de dez anos. Eu queria lhe responder alguma coisa, mas ela desapareceu. Desci do carro e procurei ao redor. Ninguém! Voltei ao carro, o motor ligado, e então percebi que o vidro da janela não estava abaixado. Como a criança pôde estender a mão até o meu ombro? Eu não entendi nada. Naquele momento, fiquei com medo. Mas daí decidi viajar. Na última segunda-feira (1º de junho de 1998) em Fátima, às 10h30, eu assistia a missa na capela das aparições e revi a criança, vestida de branco como você, com uma túnica, no altar. Ela olhava na direção da capela. Pensei que fosse um coroinha. Eu estava ajoelhado, rezando. Ela então me interpelou: “Você não está me reconhecendo?” Era o mesmo menino que eu tinha visto na minha garagem, no Brasil. “Eu sou o anjo deste país. A Santa Virgem manda lhe dizer que virá revê-lo neste lugar no dia 25 de julho de 2000. Até lá, reze, santifique-se pelo Coração de Maria e de Jesus”. Ele desapareceu depois de ter me advertido. “Fique atento, o demônio tentará tirá-lo da terra, mas Deus não o permitirá”. O que mais ele me disse eu devo guardar comigo até o dia 25 de julho de 2000.
Um segredo importante para a Igreja? Para o mundo?
– O segredo diz respeito a mim. Se eu falasse disso às pessoas, arriscaria prejudicar a obra de Deus.
Ele me confirmou os 1260 dias e precisou o local da próxima aparição.
Essa aventura lhe causa muitas dificuldades, represálias?
– Outro dia recebi uma visita. O homem estava muito nervoso. Me insultou bastante. Fiquei triste, rezei, perguntei a Deus por que essas oposições? Ele me respondeu: “Não sou eu, vocês é que são pecadores e permitem que o demônio os manipule”.
Preciso lhe contar outra coisa. Alguns dias antes de 11 de fevereiro de 1997, eu estava pintando uma imagem da Rosa Mística. Precisei de um pano para limpar o rosto da imagem, e procurei algo decente. Encontrei um velho corporal descartado após remendo, e me servi dele para limpar o rosto da Virgem. Depois disso, dobrei o corporal como ele se encontrava, não em três como no tempo em que ele servia para a hóstia, mas em quatro como o havia encontrado (sem dúvida para indicar que ele estava fora de uso), e ao dobrá-lo notei que ele estava todo manchado. Olhei bem e vi esse rosto.
Ele estendeu então um corporal de cerca de 50 centímetros de largura: as manchas impressionistas formam o rosto de Cristo, bem estilizado, como se vê no Sudário de Turim e em outros desenhos feitos conforme a visão de muitos videntes: o que tende a confirmar a autenticidade dessa imagem. O que me impressionou no caso de Raymundo foi que, diferentemente de muitas dessas imagens fortuitas onde as pessoas projetam o seu fervor em formas insignificantes e às vezes medíocres, esta é bela no seu tom monocromático mais ou menos escuro, com a mancha bem negra dos cabelos, do bigode e o esboço mais preciso dos olhos.
Raymundo: Dizem que o Cristo tinha uma moeda sobre os olhos, segundo o costume dos judeus, quando o colocaram no sepulcro, o sudário tem essa marca.
Isso é discutido, mas a imagem, ainda que um pouco vaga, lembra bem as numerosas moedas de Pilatos com que se pôde comparar. Sobre o sudário, consigo distinguir a marca de uma peça em especial sobre o olho direito, mas sobre o corporal não há marca da peça identificável.
Que dia essa marca se formou?
No dia 24 de dezembro de 1996. Nesta noite…
Portanto a noite de Natal.
– Não havia dinheiro na casa para comprar presentes, eu estava triste, e foi para superar essa melancolia que eu resolvi pintar a Virgem, apesar da minha vista ruim: o olho esquerdo sobretudo. Ela me disse (por locução): “A face de Jesus é o seu presente”. Isso foi na minha casa de campo da Vila del Rey. Nesta data a Virgem ainda me aparecia, mas eu suspeitava que não a veria mais depois do 11 de fevereiro.
Em janeiro de 1997, eu estava rezando de novo na minha casa de campo. Escutei a campainha tocar três vezes. Fui ver quem era. Era um menino de mais ou menos dez anos, vestido com roupa clara, quase loiro, pés descalços mas bem vestido. Ele me perguntou se podia rezar comigo na capela.
“Você me conhece? eu perguntei.
– Sim, e à sua capela também”.
Preparei então o altar para colocar o corporal sobre ele. A criança disse:
“Disponha bem o presente da Virgem”.
Eu ia tocá-lo, mas ele me disse:
“Não me toque.
– Quem é você? Um anjo?
– Nossa Senhora me autorizou a dizer que sim”.
Desdobrei o corporal com a efígie do Cristo e ele me fez compreender: toda vez que olhamos para o rosto de Nossa Senhora, vemos Jesus. Foi isto que aconteceu quando eu limpava o rosto de Nossa Senhora com este corporal.
Essa é uma Virgem da Medalha Milagrosa? de Lourdes?
– Não, uma Virgem mexicana. Por que isso aconteceu eu não sei.
Até aqui foi Raymundo que conduziu a conversa, eu não tinha feito as minhas perguntas.
Você terminou? Porque eu também tenho coisas a lhe perguntar.
– Sim.
Os missionários continuam com o trabalho no Serviço de Informação Mariana?
– Sim (com um grande sorriso bem expressivo).
E com a família, vai tudo bem?
– Sim, muito bem.
A sua mulher está de acordo com essa vida mais austera?
(Sempre com um sorriso bem largo.)
– Sim.
E a sua filha deficiente, como vai?
– Ela vai bem. Vai ser operada no cérebro pela décima terceira vez, para trocar uma prótese sem a qual ela não poderia sobreviver.
Que idade ela tem?
– Cinco anos.
Ela não pode andar. Mas ela consegue falar?
– Não, mas às vezes ela canta.
Então ela canta sem articulação, ela murmura?
– Não, ela canta a Ave Maria de Lourdes e pronuncia bem a palavra Ave. Esta é a sua conversa.
Ele disse isso com uma verdadeira ternura, estranha aos complexos que possuem, compreensivelmente, os pais de crianças deficientes.
Ela é afetuosa?
– Sim, ela me faz carinho, brinca nos braços da mãe, ela adora puxar os cabelos do irmão, ela nos acorda de manhã cantando a Ave Maria.
Você lida bem com essa prova, com afeição e sem tristeza.
(Muito vivamente) – Não, isso não é uma prova! Tudo é graça da parte de Deus! Se eu dissesse que era uma prova, isso seria insultar a graça de Deus.
Eu fiquei muito impressionado com essa resposta e sobretudo com a expressão tão límpida, sorridente, descontraída: a alegria perfeita de Francisco de Assis. Raymundo me pareceu ter chegado bem longe na perfeição do amor, com toda a leveza e as nuances que sabe colocar nela um brasileiro, do país da conviventia.
E o menino?
– Ele tem nove anos agora.
Seu nome?
– Frederico.
E com ele, vai tudo bem? Saúde, escola?
(Sempre com um terno sorriso quando ele pensa nos filhos) – Sim, mas ele não gosta da serpente nos pés de Nossa Senhora, como está na medalha. Ele me diz: “Só isso que eu não gosto na Nossa Senhora”. Eu disse a ele um dia: “Eu quero ser santo. – Então você também vai ter uma serpente nos pés”.
Foi então que eu vi a medalha que Raymundo carregava no pescoço, na ponta de uma corrente bem ordinária: uma grande medalha, como na imagem de sua aparição. De fato, a serpente sob o M, inicial de Maria, como na Medalha Milagrosa, tem um tamanho bem relevante.
– Sim, isso incomoda os outros. Uma senhora veio me repreender. Ela me disse: “Eu não quero usar a sua medalha, a medalha da serpente! A medalha do demônio! Como é que você pode usar isso?” Eu respondi, sem saber muito bem por quê: “Mas como você consegue usar esse pecado que pesa sobre os seus ombros?” Ela empalideceu, chorou, depois desabou.
Isso foi o alívio no Espírito? Ela caiu sem dúvida, e sem se fazer mal.
– Sim, na juventude, antes do casamento, ela tinha abortado dois gêmeos, e nunca ousou confessar esse pecado. Mesmo sendo líder de um grupo carismático e ministra da Eucaristia. Depois disso, ela foi se confessar. O padre lhe pediu para interromper as suas atividades como ministra da Eucaristia.
Por quê, uma vez que ela tinha confessado e estava perdoada?
– Por um tempo de penitência somente, para ir até o fim da sua purificação.
Há outros fatos significativos que você ainda não me contou?
– Um dia, em Porto Alegre, era 1996, eu estava ao lado de um senhor de gravata. A Virgem me disse:
“Você está ao lado de um padre”.
Eu disse:
“Não, é um leigo com uma gravata”.
“Sim, é um padre”, ela respondeu.
Eu então perguntei ao meu vizinho:
“Você é padre?”
“Não”, ele me respondeu.
Falei com a Virgem:
“A Senhora se enganou…”
Ela me disse:
“Insista”.
Perguntei uma segunda vez, e recebi outro “não”.
Perguntei uma terceira vez. Nisso ele começou a chorar. Também desabou, e tive que segurá-lo para que ele não caísse da cadeira. Ele era padre, mas tinha deixado o sacerdócio e se casaria no dia seguinte. Ele então renunciou ao projeto do casamento. A Virgem me pediu para dizer a ele: “Você já está casado, indissoluvelmente, pelo seu sacerdócio”.
Há também curas em torno de você e dos missionários?
– Sim, mas eu não gosto de falar disso.
E quantos são vocês, os missionários?
– Há missionários agora por todo o Brasil. Nos dias 6 e 7 de abril, na reunião geral, eles eram 600, não somente do Brasil, mas de quase toda a América do Sul: Argentina, Chile, Equador, Uruguai, Paraguai, Peru.
É você que dirige os missionários e os ensina?
– Eu não falo muito sobre as aparições, como me pediu a Virgem, mas do valor da Eucaristia. O próximo grande encontro acontecerá no dia 13 de maio de 2000.
E há bons frutos?
– O importante são as curas espirituais (ele enfatizou a segunda palavra).
Fiquei preocupado a respeito desse padre Rubem, que estava na missa de 11 de fevereiro de 1996, e que peregrina com uma imagem da Virgem em encontros de oração pelo Brasil, porque ele não tem a permissão do bispo dele e estaria até suspenso (proibido de exercer suas funções sacerdotais). Escrevi ao bispo dele para esclarecer este ponto. Ele não me respondeu. Fico preocupado com você, por causa desse contato com um padre irregular, porque isso pode desacreditar o seu testemunho.
– Eu me preocupo também, não estou de acordo. Pedi a ele que se reaproximasse do bispo, que encontrasse uma solução na Igreja, mas não cortei os laços com ele, porque ele ama muito a Deus. Mas como o bispo não quer que ele continue a fazer essas viagens com a Virgem peregrina, com isso eu também não estou de acordo. Perguntei à Virgem se ela queria que eu rompesse com ele. Ela sorriu e me disse: “Esta não é a vontade de Deus. Esse padre vai guardar a fé, isso o fará mais paciente, mais sereno. Tenha paciência, Jesus o ajudará”. Eu amo o padre Rubem.
Sem parecer, Raymundo carrega um fardo bem pesado, a vista limitada do olho esquerdo, sua filha deficiente, os problemas com dinheiro que ele parece menosprezar, a preocupação do contato com o seu bispo, com esse padre em situação irregular, e a pesada direção dos missionários cada vez mais numerosos. Ele carrega tudo isso com serenidade, em Deus. Eu lhe disse antes de nos despedirmos:
“Deus trabalhou bastante com você desde que nos encontramos na Bolívia no ano passado. Você ainda estava angustiado naquele momento”.
Estou impressionado com a paz profunda que ele encontrou, seu equilíbrio e seu brilho simples. Seu abandono a Deus e sua confiança. Ele é dessas pessoas diante das quais me sinto bem pequeno, porque a presença de Deus preenche verdadeiramente toda a sua vida, muito profundamente e com transparência ao mesmo tempo. Duas pessoas presentes também ficaram impressionadas.