Sínodo da Amazônia: Cardeais e Bispos, os senhores realmente querem uma Igreja assim?

Catequese

Os Bispos, sucessores dos Apóstolos, e os Cardeais, conselheiros do Papa no governo da Igreja, ficarão calados diante deste manifesto político-religioso que coloca de cabeça para baixo a doutrina e a práxis do Corpo Místico de Cristo?

Roberto de Mattei.

Adelante la fé, 22 de junho de 2019.

[https://adelantelafe.com/sinodo-de-la-amazonia-senores-cardenales-y-obispos-de-verdad-quieren-una-iglesia-asi/].

Tradução. Bruno Braga.

 

As primeiras reações ao Instrumentum laboris para o Sínodo da Amazônia se concentraram na abertura da possibilidade de sacerdotes casados e na inclusão da mulher no sacerdócio da Igreja. Porém, o Instrumentum laboris é mais que isso: trata-se de um manifesto da ecoteologia da libertação que propõe uma visão panteísta e igualitária inaceitável para um católico. Como destacou corretamente José Antonio Ureta [1], trata-se de escancarar as portas do Magistério para a ecologia indígena e a ecoteologia, derivados hispano-americanos da Teologia da Libertação, cujos líderes, após a queda da União Soviética e o fracasso do autêntico socialismo, atribuíram aos povos indígenas e à natureza o papel histórico de força revolucionária em clave marxista.

No documento, publicado pela Santa Sé no último dia 17 de junho, a Amazônia irrompe como “um novo sujeito” na vida da Igreja (n. 2). E o que é a Amazônia? É mais que um lugar físico, é uma “biosfera complexa” (n. 10), mas é também “uma realidade repleta de vida e sabedoria” (n. 5) que se converte em paradigma conceitual e convoca a uma conversão “pastoral, ecológica e sinodal” (n. 5). Para cumprir a sua missão profética, a Igreja tem que se colocar na escuta dos “povos amazônicos” (n. 7). Esses povos são capazes de viver em harmonia com todo o Cosmos (n. 12), mas os seus direitos estão ameaçados pelos interesses econômicos das multinacionais que, como dizem os indígenas de Guaviare (Colômbia), “cortaram as veias da nossa Mãe Terra” (n. 17). A Igreja “escuta os clamores tanto dos povos como da terra” (n. 18), porque a Amazônia é um lugar teológico a partir do qual se vive a fé, e também uma fonte peculiar de revelação de Deus (n. 19). Junto das Sagradas Escrituras e da Tradição, acrescenta-se uma terceira fonte à Revelação: a Amazônia, território onde “tudo está interligado” (n. 20), “constitutivamente em relação, formando um todo vital” (n. 21). Na Amazônia, torna-se realidade o ideal comunista, porque, no coletivismo tribal, “tudo é compartilhado, os espaços particulares – típicos da modernidade – são mínimos” (n. 24).

Os povos indígenas se libertaram do monoteísmo e recuperaram o animismo e o politeísmo. E mais, como se lê no n. 25, “a vida das comunidades amazônicas ainda não atingidas pelo influxo da civilização ocidental se reflete na crença e nos ritos sobre a atuação dos espíritos, da divindade – chamada de inúmeras maneiras – com e no território, com e em relação à natureza. Esta cosmovisão se resume no ‘mantra’ de Francisco: ‘Tudo está interligado’ (LS, 16, 91, 117, 138 e 240)”.

O documento afirma com insistência que a cosmovisão amazônica abarca “sabedoria ancestral, reserva viva da espiritualidade e da cultura indígena” (n. 26). Portanto, “os povos amazônicos originários têm muito a ensinar-nos”. […] “Os novos caminhos de evangelização devem ser construídos em diálogo com estas sabedorias ancestrais em que se manifestam as sementes do Verbo” (n. 29). A riqueza da Amazônia não consiste em ser monocultural, mas em constituir “um mundo multiétnico, multicultural e multirreligioso” (n. 36), com o qual é necessário estabelecer um diálogo. Os povos amazônicos “nos confrontam com a memória do passado e com as feridas causadas durante longos períodos de colonização. Por isso, o Papa Francisco pediu ‘humildemente perdão, não só pelas ofensas da própria Igreja, mas também pelos crimes contra os povos nativos durante a chamada conquista da América’. Neste passado, às vezes a Igreja foi cúmplice dos colonizadores, sufocando a voz profética do Evangelho” (n. 38).

A ecologia integral inclui “a transmissão da experiência ancestral, cosmologias, espiritualidades e teologias dos povos indígenas, em volta do cuidado da Casa Comum” (n. 50). Esses povos, “em sua sabedoria ancestral cultivaram a convicção de que a criação inteira está interligada, o que merece nosso respeito e responsabilidade. A cultura da Amazônia, que integra os seres humanos com a natureza, se constitui como referente para construir um novo paradigma da ecologia integral” (n. 56). A Igreja tem que despojar-se de sua romanidade e assumir um rosto amazônico: “O rosto amazônico da Igreja encontra sua expressão na pluralidade de seus povos, culturas e ecossistemas. Esta diversidade tem necessidade da opção por uma Igreja em saída e missionária, encarnada em todas as suas atividades, expressões e linguagens” (n. 107). “Uma Igreja com rosto amazônico, em seus pluriformes matizes, procura ser uma Igreja ’em saída’ (cf. EG, 20-23), que deixa atrás de si uma tradição colonial monocultural, clericalista e impositiva, que sabe discernir e assumir sem medo as diversificadas expressões culturais dos povos” (n. 110). O espírito panteísta que anima a natureza amazônica é um leitmotiv do documento. “O Espírito criador que enche o universo (cf. Sb 1, 7) alimentou a espiritualidade destes povos ao longo dos séculos, ainda antes do anúncio do Evangelho, e é Ele que os leva a aceitá-lo a partir de suas próprias culturas e tradições” (n. 120). Portanto, “é preciso captar aquilo que o Espírito do Senhor ensinou a estes povos ao longo dos séculos: a fé no Deus Pai-Mãe Criador, o sentido de comunhão e a harmonia com a terra, o sentido de solidariedade para com seus companheiros, o projeto do ‘bem viver’, a sabedoria de civilizações milenares que os anciãos possuem e que influi sobre a saúde, a convivência, a educação, o cultivo da terra, a relação viva com a natureza e a ‘Mãe Terra’, a capacidade de resistência e resiliência, em particular das mulheres, os ritos e as expressões religiosas, as relações com os antepassados, a atitude contemplativa e o sentido de gratuidade, de celebração e de festa, e o sentido sagrado do território” (n. 121).

Ademais, em função de uma salutar descentralização da Igreja, “as comunidades pedem que as Conferências Episcopais adaptem o ritual eucarístico às suas culturas” (n. 126, d). “A Igreja deve encarnar-se nas culturas amazônicas que possuem um elevado sentido de comunidade, igualdade e solidariedade, e por isso não se aceita o clericalismo em suas diferentes formas de manifestação. Os povos originários possuem uma rica tradição de organização social, na qual a autoridade é rotativa e dotada de um profundo sentido de serviço. A partir desta experiência de organização, seria oportuno reconsiderar a ideia de que o exercício da jurisdição (poder de governo) deve estar vinculado em todos os âmbitos (sacramental, judicial e administrativo) e de maneira permanente ao sacramento da ordem” (n. 127). Partindo da premissa de que “o celibato é uma dádiva para a Igreja”, pede-se expressamente que, “para as áreas mais remotas da região, se estude a possibilidade da ordenação sacerdotal de pessoas idosas, de preferência indígenas, respeitadas e reconhecidas por sua comunidade, mesmo que já tenham uma família constituída e estável, com a finalidade de assegurar os Sacramentos que acompanhem e sustentem a vida cristã” (n. 129). Além disso, é necessário garantir às mulheres “sua liderança, assim como espaços cada vez mais abrangentes e relevantes na área da formação: teologia, catequese, liturgia e escolas de fé e de política” (n. 129, c, 2), assim como “identificar o tipo de ministério oficial que pode ser conferido à mulher, tendo em consideração o papel central que hoje ela desempenha na Igreja amazônica” (n. 129, a, 3).

O que mais se pode acrescentar? Os Bispos, sucessores dos Apóstolos, e os Cardeais, conselheiros do Papa no governo da Igreja, ficarão calados diante deste manifesto político-religioso que coloca de cabeça para baixo a doutrina e a práxis do Corpo Místico de Cristo?

NOTAS.

[1]. cf. [https://edwardpentin.co.uk/amazon-synod-working-document-criticized-for-serving-neo-pagan-agenda/].

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