Mt 7, 6 -14
Nesta passagem, Jesus nos mostra quatro modos de agir diante de Deus: saber dar, saber pedir, saber receber e saber escolher. O Evangelho não são palavras soltas, sem nexo, ou apenas uma história moral. O Evangelho é a revelação divina. Nele se encerra um ensinamento perfeito. Jesus esconde em Suas palavras um sentido divino de vida.
Saber dar – Ninguém dá o que não tem. Tendo, não deve dar à pessoa errada. “Não deis aos cães o que é santo, nem atireis aos porcos as vossas pérolas”.
Falar das coisas de Deus, levar as palavras de Jesus é muito sério. Devemos saber como e a quem falar.
Temos como exemplo Jesus diante de Pilatos. Qualquer resposta que lhe desse seria algo sagrado que, naquele momento, se voltaria contra Ele. Seria a Sua defesa diante de pessoas sem espiritualidade e numa hora em que não devia ser perdoado, pois a profecia se cumpriria ali, era um momento decisivo para a história da salvação, que se consumaria na Sua condenação e morte de cruz. Então Ele se calou e deixou que agissem, para que se completasse a salvação. Jesus não deu a Pilatos o sagrado.
Saber dar o que é santo, saber discernir é importante em nossa vida. Não devemos dar as coisas de Deus a pessoas despreparadas para recebê-las, porque irão entendê-la de outra forma, voltarão contra nós e farão com que a vontade de Deus não se realize em nossa pessoa. Não se deve levar uma doutrina preciosa e santa a pessoas sabidamente incapazes de apreciá-la e que poderiam fazer mau uso dela.
Saber pedir – “Pedi e vos será dado, buscai e achareis; batei e vos será aberto”. Saber pedir é sério, temos responsabilidade pelo que pedimos, por suas consequências. Não que Deus irá nos atender em tudo e incondicionalmente. Absolutamente! Sabemos que não é assim. Para pedir é preciso entender a vontade de Deus; a nossa vontade nem sempre é a vontade de Deus. Quando compreendemos isto, percebemos que Deus conduz as nossas coisas, para que aconteçam como deve ser. No entanto, a vontade de Deus só se realiza em nós se permitimos: é o livre-arbítrio que nos deu. Isto, porém, não exclui Sua autoridade em intervir quando assim o entender. Se diante de nossos problemas nos mantivermos pacientes e confiantes em Deus, a Sua vontade se fará. Isto é pedir com o discernimento de que, apesar de termos vontade própria, é a vontade de Deus que deve prevalecer, pois só Ele sabe realmente o que é melhor para nós. Isto é saber pedir.
Saber receber – “Tudo que quereis que os homens vos façam, fazei-o vós a eles”. Nós não sabemos receber as coisas. Queremos receber sem nada oferecer, sem criar aquela situação de se dar primeiro. É só vem a nós. Se não soubermos dar, não saberemos receber. Por isso é preciso estar atento ao que se dá e como o faz, pois daí decorrerá o que há de receber.
Recordemos Mt 6,1.3: “Guardai-vos de praticar a vossa justiça diante dos homens para serdes vistos por eles. Se o fizerdes, não recebereis a recompensa do vosso Pai que está nos céus… Quando deres uma esmola, não saiba a tua mão esquerda o que faz a tua direita.” Não troquemos a recompensa celeste pela terrena. Aquele que souber dar, saberá receber. São Francisco discerniu muito bem isto.
Saber escolher –reino da matéria em que vivemos é a porta larga, é aquela opção que fazemos e que parece mais vantajosa aos olhos da matéria. Quando Adão e Eva fizeram-na, pecaram contra Deus, lhes fora oferecido serem como Deus, ter o conhecimento do bem e do mal. Foi a porta larga da matéria que se abriu para eles. A soberba falou mais alto. Obedecer a Deus tornou-se então difícil.
O Reino de Deus é diferente, não está no plano da matéria, mas do espírito. Se ficarmos sempre voltados para as portas largas da matéria, que nos levam aos prazeres do mundo, será difícil entender o outro lado. Jesus nos fala que a porta é estreita, porque é através dela que vamos entender as coisas do espírito. E isto não é fácil.
Jesus coloca todas as coisas “meio brandas” sob a capa moral, mas que têm uma espiritualidade fora do comum, divina! Só mesmo os bem-aventurados sentem que o progresso na vida espiritual passa por aquela “porta estreita”.
Esta é a doutrina dos dois caminhos – o do bem e o do mal – entre os quais o homem deve escolher.
A espiritualidade não caminha com a materialidade, são dimensões opostas; por isso não é reconhecida e valorizada pelo mundo, que ostenta outros valores. Daí aquilo que tristemente constatamos: a pessoa vale pelo que tem, e não pelo que é. É também a razão de alcançarem êxito nesta vida aqueles que menos se preocupam com as coisas do espírito, com os valores éticos e morais, com a vivência da Palavra de Deus. E é por isso que Jesus disse: Se queres ganhar a vida (vida eterna), trata de perdê-la (vida terrena).
Por isso avançar no sentido do bem parece ser complicado. Mesmo buscando a porta estreita, podemos ter doenças, passar por dificuldades de toda ordem, inclusive financeira. Isto é ter problemas de ordem material; mas a graça de Deus não nos faltará, contaremos com a Sua proximidade, perceberemos a Sua presença, Seus sinais, Suas respostas, e estaremos crescendo a Seus olhos.
Como isto é bonito! Como nos dá força para prosseguirmos! Isto é a graça de Deus! Isto é saber dar, pedir, receber e escolher. Isto é discernir, entender as coisas do Céu. E é isto que Jesus aqui nos fala através de Mateus.
Referência: LOPES, Raymundo. Os quatro modos de agir diante de Deus: Mt 7, 6 -14. In: LEMBI, Francisco (Org.). O Código Jesus. Belo Horizonte: Magnificat, 2007. p. 71.