As Promessas e a Aliança com Abraão

Gn 15, 5-12 . 17-18 ; Lc 9 , 28-36

Quando a Igreja elabora um calendário litúrgico, ela o faz de forma racional, combinando as leituras. Mas o Espírito de Deus atua nesta escolha. Se não acreditarmos em Sua presença na Igreja, duvidaremos de muita coisa.

A Igreja preparou, neste caso, os versículos 5 a 12 e 17 a 18 do capítulo 15 do Gênesis. Vejamos como o Espírito Santo funcionou: a Igreja fez esta escolha para combinar com o Evangelho. Selecionou os vv. 5 a 12, saltou os vv. 13 a 16 e finalizou com os vv. 17 a 18; e escolheu o Evangelho de Lucas (9,28-36): A Transfiguração. Isto nos faz crer que realmente Deus direciona as coisas da Igreja.

Vejamos, agora, a relação entre os dois.

Deus nos mostra, neste contexto, a Sua grande Aliança com o homem, que termina no momento em que Jesus se revela em Sua natureza divina, ou seja, na transfiguração.

No Gênesis, vemos: "O Senhor conduziu Abraão para fora e disse: 'Ergue os olhos para o céu e conta as estrelas, se as podes contar'". É como dissesse: Sai de ti mesmo, esquece as tuas coisas interiores, o teu racionalismo, o teu cotidiano, as tuas dificuldades; vê a minha criação.

Se não conseguimos nos desvencilhar do nosso racionalismo, das nossas preocupações mundanas, não entenderemos a criação de Deus. "…e acrecentou: 'Assim será a tua posteridade.'" Deus não se referia à quantidade de filhos que Abraão teria, à sua prole ou a uma raça. Como já foi dito: "não só à descendência segundo a Lei, mas sobretudo à descendência segundo a fé de Abraão, que é o pai de todos nós." A nossa religião nasceu de Abraão, surgiu de sua aliança com Deus, prefigurada em Noé (Gn 6,18; 9,9-17), restabelecida com todo o povo através de Moisés (Ex 19,1 +), "na esperança da 'nova aliança' concluída na plenitude dos tempos (Mt 26,28 +; Hb 9,15 +):

'Cristo sela a nova Aliança pelo seu Sangue."

Deus mostra a Abraão que dele viria a grande religião da nova Aliança, esta é a descendência da qual Deus lhe fala; portanto, "uma descendência que tem mais a ver com o espírito do que com a carne e, por esta característica, ela prefigura a descendência dos cristãos."

"Abraão creu em Deus, e lhe foi tido em conta de justiça."1

Isto quer dizer que Abraão teve certeza, naquele momento, que seria o canal de algo grandioso, o que tomou como a Justiça de Deus.

E Deus lhe disse: "Eu sou o Senhor que te fez sair de Ur dos caldeus, para te dar esta terra como herança." Deus não se referia apenas a uma porção de terra, a uma área para Abraão se fixar com os seus. Ele não viria somente para isto. Queria também dizer: Eu te tirei da escravidão de ti mesmo, da escuridão do teu eu, para te colocar numa terra prometida, e fazer contigo uma grande aliança; serás o pai da religião que colocarei no mundo.

"Abraão respondeu: 'Meu Senhor Deus, como saberei que hei de possuí-la?'" Abraão não questionou Deus, pediu-lhe o seguimento da Aliança. Quis assim dizer: Se o Senhor me diz que serei o pai desta grande Aliança, como isto acontecerá? O que devo fazer, para que se realize conforme a vossa vontade?

"Deus lhe disse: Traz-me uma novilha de três anos, uma cabra de três anos, um cordeiro de três anos, uma rola e um pombinho." Deus não pediu estas coisas simplesmente para sacrifícios. Ele usou do velho rito de aliança, tomando três animais de quatro pernas, com três anos de idade cada um, para dizer: Farei contigo uma Aliança em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Os três animais somavam doze pernas, número que representa: a totalidade do que lhe dava ao estabelecer a Aliança (vv. 18 a 20); as tribos de Israel (seu povo); os apóstolos de Cristo, fundamentos de Sua Igreja. Deus pediu a Abraão: Traz a Igreja, para ser amparada no Pai, no Filho e no Espírito Santo.

A rola e a pombinha, que também foram pedidas, têm dois pés cada, totalizando quatro pés, simbolizando os quatro evangelhos da Igreja que surgiria da nova Aliança. Não foram sacrificadas, porque sua hora ainda não havia chegado.

Podemos ainda dizer que a rola representava Eva e a pombinha Nossa Senhora. Eva errou pela desobediência e foi punida, enquanto Nossa Senhora aceitou pela obediência e ganhou o Céu. Representavam também a lei e a profecia. Eva ligada à lei, pois desobedeceu a uma lei de Deus, Nossa Senhora obedeceu e é a grande profetisa dos últimos tempos.

"Abraão tomou todos esses animais, partiu-os pelo meio e colocou suas metades uma defronte da outra; mas não cortou as aves." Isto significa a divisão que temos entre o humano e o divino. De um lado da Igreja está o humano, do outro o divino. Deus conduzia tudo aquilo inspirando Abraão a fazer o que tinha de fazer. Ali, naquela ação de Abraão, estavam a Igreja humana e a divina, uma defronte da outra.

"As aves rapineiras desceram sobre os cadáveres, mas Abraão as enxotou." Aqui temos a profecia do caminhar das Igrejas humana e divina, as aves de rapina, isto é, as maldades que caminham com a humanidade atacariam as duas Igrejas, mas a herança de Abraão, ponto central no qual acreditamos até hoje, espantaria estas coisas ruins.

"Quando o sol ia se pôr, (no final dos tempos), veio um profundo sono a Abraão, e eis que foi tomado de grande pavor, uma espessa escuridão." É o que nós temos hoje. No final dos tempos, dormindo em berço esplêndido, mas sempre com a expectativa de que algo vai acontecer. Foi isto que aconteceu com Abraão. Ele caiu naquele sono com medo do final dos tempos, porque algo temeroso ia acontecer. "Quando o sol se pôs e estenderam-se as trevas, eis que uma fogueira fumegante e uma tocha de fogo passaram entre os animais divididos." Quer dizer, quando baixar sobre o homem as trevas, em que a esperança se desvanecer, surgirá um braseiro fumegante e uma tocha de fogo. É aí que Jesus vem passar entre a Igreja humana e a Igreja divina. Por que passou entre os animais divididos? Porque aquele fogo abrasador de Jesus vai unir as duas, vai acabar com a ferida, vai cauterizá-la, eliminando-lhes o mal que as divide.

"Naquele dia o Senhor estabeleceu uma aliança com Abraão nestes termos: 'À tua posteridade darei esta terra, do Rio do Egito até o Grande Rio, o Eufrates…'" São citados aqui doze elementos: a terra e onze povos.

Quando Jesus realizar o seguimento de unir, para entendermos o que são as duas Igrejas, compreenderemos o que tem na mente de Deus. O que é a grande aliança de Deus para conosco.

A terra a que se refere, do Rio do Egito ao Grande Rio, o Eufrates, é o entendimento limitado que hoje temos da religião católica.

Vamos caminhar mais um pouco na compreensão destes ensinamentos, com a leitura de Lucas 9,28-36.

"Jesus, tomando consigo a Pedro, João e Tiago, subiu ao monte para orar." Tomou a Pedro, a Igreja humana, e a João, a Igreja divina, com o fio condutor entre elas, Tiago, e subiu a montanha para orar. Isto é, se elevaram em oração as duas Igrejas.

"Enquanto orava, o aspecto de seu rosto se alterou, suas vestes tornaram-se de fulgurante brancura. E eis que dois homens conversavam com Ele: eram Moisés e Elias." Vimos acima que as duas aves de Abraão simbolizavam Eva e Nossa Senhora, a Lei e a Profecia. E aqui, em Lucas, temos Moisés, a Lei, e Elias, a Profecia. Novamente, estas figuras se repetem.

"…(Moisés e Elias) aparecendo envoltos em glória, falavam de Sua partida (morte de Jesus) que iria se cumprir em Jerusalém." Isto aconteceria porque a aliança de Deus com os homens se consumaria na cruz. Era disso que falavam. Com certeza, se reportavam à aliança de Deus com Abraão, que se completaria na cruz: a religião católica, com seu fundamento em Abraão, nasce da cruz.

"Pedro e os companheiros estavam com muito sono." Isto é, a Igreja, sonolenta, não percebe as verdades em torno de si mesma.

"Ao despertarem, viram a Sua glória (de Jesus) e os dois homens que estavam com Ele." A Igreja desperta desse sono que paira sobre si, e vê Jesus na glória, com a Lei e a Profecia ao Seu lado. Moisés e Elias, Eva e Nossa Senhora.

"E quando estes iam se afastando, Pedro disse a Jesus: 'Mestre, é bom estarmos aqui; façamos pois três tendas: uma para ti, outra para Moisés e outra para Elias.'" Pedro, a Igreja humana, aquela que erra, cai e levanta, disse a Jesus: Mestre, é bom estarmos aqui. Lógico, é como pensamos, pois o nosso racionalismo se compraz ao abrigo da graça de Deus, e prefere ignorar, às vezes, o que Deus tem para nos falar. É o racionalismo da Igreja.

"Façamos pois três tendas…".

Quantos e quais foram os animais que Deus pediu a Abraão? Três: uma novilha, uma cabra e um cordeiro, animais que possuem quatro pernas. A Igreja humana propõe a Jesus a mesma coisa, só que na figura da tenda. As tendas judaicas têm quatro pernas. Isto significa que a Igreja humana não sabia o que propunha; enquanto Moisés e Elias discutiam com Jesus sobre toda aquela descendência de Abraão, a Igreja dormia. É o que se vê até hoje. As coisas acontecendo em nossa volta e nós, sonolentos, sem percebê-las. Com isso, demos oportunidade ao Mal de agir, realizando seu plano nas três etapas de 600 anos cada.

"Ainda falava (Pedro) quando uma nuvem desceu e os cobriu com sua sombra; e ao entrarem eles na nuvem, os discípulos se atemorizaram." Isto é o que vemos hoje: uma densa nuvem cobre toda a Igreja. Nós estamos dentro dessa nuvem do final dos tempos. Já não sabemos o que Jesus deseja de nós. A nuvem turva nossa vista, encobre o nosso intelecto, tomando conta de nossa razão. A fé desvanece. No auge da travessia dessa espessa nuvem estaremos atemorizados.

"Da nuvem, porém, veio uma voz dizendo: 'Este é o meu Filho muito amado; ouvi-o sempre.'" Nós temos esperança que desta nuvem de incredulidade, onde nos vemos perdidos, sem saber o que falamos, venha esta voz de Deus, a nos dizer: "Este é o meu Filho escolhido. Escutem-no!" É a grande Aliança de Deus que se completa, aquela que foi anunciada desde Abraão.

"Ao ressoar esta voz, Jesus ficou sozinho." Isto nos fala da cruz. Jesus crucificado tinha diante de si apenas Nossa Senhora. João estava ali por causa dela, com quem se preocupou. Os outros apóstolos não tiveram coragem de estar lá. João sabia o que aconteceria com Jesus, mas nada podia fazer. Jesus estava sozinho porque a Mãe e o Filho são um só, era um sofrimento só. É como se Nossa Senhora estivesse também na cruz com Jesus, naquele momento. Era a solidão do Filho e da Mãe. João apenas presenciava.

"Os discípulos mantiveram silêncio e, naqueles dias, a ninguém contaram coisa alguma do que tinham visto." Vimos, portanto, uma ligação entre o Gênesis, que é o início, e a Transfiguração, que é praticamente o final, pois logo depois veio sua crucificação e morte.

Deus nos mostra, por último, a ligação daquilo que teve início no Gênesis, com Abraão, e se consumou na cruz, com Jesus: a fundamentação da religião, a grande Aliança de Deus com o homem.

São Paulo fala (Fl 3,18): "Pois muitos dos quais muitas vezes eu vos disse e agora repito, chorando, que são inimigos da cruz de Cristo: seu fim é a destruição…". Quer dizer, inimigos da Aliança. São Paulo entendeu e falou isto há dois mil anos atrás. Se estivesse aqui, hoje, vendo a incredulidade que impera na Igreja, certamente choraria muito mais.

Ao falarmos da Transfiguração de Jesus, devemos ir ao Gênesis (15,5-12.17-18), onde Deus estabelece com Abraão uma aliança para a salvação da humanidade, que se completa com Jesus.

Assim poderemos explicar por que somos católicos: porque cremos numa Aliança que vem do começo. Abraão ofereceu a Deus um sacrifício que se estendeu até Jesus, que por sua vez o eternizou na cruz, deixando-nos como garantia a Igreja divina e a Igreja humana.

 

¹ "A fé de Abraão é a confiança numa promessa humanamente irrealizável. Deus lhe reconhece o mérito deste ato (cf. Dt 24,13; Sl 106,31), coloca-o na conta de Sua justiça, sendo 'justo' o homem cuja retidão e submissão o tornam agradável a Deus. Paulo utiliza o texto para provar que a justificação depende da fé e não das obras da Lei: mas a fé de Abraão guia a sua conduta, é princípio de ação, e Tiago pode invocar o mesmo texto para condenar a fé 'morta', sem as obras da fé."

 

Referência: LOPES, Raymundo. As Promessas e a Aliança com Abraão: Gn 15, 5-12 . 17-18 ; Lc 9 , 28-36. In: LEMBI, Francisco (Org.). O Código Jesus. Belo Horizonte: Magnificat, 2007. p. 28.

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